2008-05-28

John Cale na Casa das Artes – um dos melhores concertos do ano em Vila Nova de Famalicão




A Casa das Artes proporcionou, mais uma vez, um espectáculo de qualidade superior, ao público não só de Famalicão mas também oriundo de cidades vizinhas, como Porto, Braga e Guimarães, que vieram propositadamente para assistir ao concerto.

A tónica dominante da performance resume-se a três pares de palavras-chave associadas: energia e vitalidade; ritmo contagiante e fusão de estilos musicais (clássico e rock).

Características que facilmente se explicam pela formação musical deste emblemático compositor e interprete galês, cuja carreira despoletou nos finais dos anos sessenta ao lado de Lou Reed com os Velvet Underground.
Após afastar-se de Lou Reed, Cale inicia a sua carreira a solo com o disco Vintage Violence, tendo produzido mais de três dezenas de trabalhos discográficos desde então.

Ainda criança, John Cale demonstrava, já, um talento indiscutível como intérprete no piano e na viola de arco. Foi, no entanto quando estudava em Goldsmith’s College London que começou a interessar-se pela música electrónica e avant-garde. É após receber uma bolsa de estudos para a Universidade de Boston nos Estados Unidos para continuar a sua formação musical na Orquestra de Tanglewood, que Cale desenvolverá os seus talentos musicais noutra vertente: o experimentalismo. Sobretudo após conhecer Lou Reed com cuja parceria procederá à fusão entre os dois estilos.

“Eu sabia que a música que fazíamos não podia ser ignorada, havia muitos elementos do classicismo naquilo que estávamos a fazer para que as pessoas encarassem essa trabalho como simples “barulho”. Era muito construído…” (Fonte: wikipedia).

De facto, John Cale sempre se situou no limiar do rock, ao traçar o seu percurso evolutivo na senda do experimentalismo – um dos motivos que o levou à separação de Lou Reed e à dissolução dos Velvet Underground – e em cisão absoluta com o mainstream. John Cale é, como tal, para muitos especialistas, um dos precursores do punk.
O reencontro com Lou Reed deu-se em 1990 com o trabalho Songs for Drella, dedicado a Andy Warhol.

O traço principal, na música de Cale consiste, sobretudo, na integridade estética e criativa apesar do estilo marginal, híbrido ou, se quisermos, fronteiriço, em termos de género musical.

A voz exibe uma tonalidade ligeiramente nasalada, por vezes um pouco semelhante à de Willie Nelson e, simultaneamente grave, ligeiramente rouca, a lembrar um pouco Springsteen.

Com uma carreira que conta já com mais de três décadas, Cale consegue, sem dificuldade, electrizar toda uma plateia, com esta sua Acoustimatic Band, ao misturar o estilo country, rock, sons africanos, alternados com notas de instrumentos orquestrais. Por vezes, temos a sensação de ouvir gritos de gaivotas arrancados das cordas de um contrabaixo, acordes extraídos do keyboard a fazer lembrar um compasso de uma sonata de Beethoven, ou uma guitarra eléctrica a trazer-nos sons de inspiração mediterrânica como um bandolim grego.

Um espectáculo inesquecível, com o último refrão cantado à capela no último dos encores, na vã tentativa de satisfazer um público insaciável…

Cláudia de Sousa Dias

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2008-05-16

Cineliterário no dia 23 de Maio - "O Amante" de Jean-Jacques Arnaud baseado no romance homónimo de Marguerite Duras




Na próxima 6ª feira dia 23 de Maio a Biblioteca Muunicipal de Vila Nova de Famalicão irá exibir o fime "O Amante de Jean-jacques Arnaud, em mais uma sessão do Cineliterário.


"L'Amant" (1992 - 111m) é baseado no romance homónimo de Marguerite Duras, que vendeu mais de um milhão de cópias em mais de 43 línguas, é a profjecção das suas "memórias de juventude" na Indochina francesa ,revestindo-se de uma carácter fortemente autobiográfico.





Com uma interpretação brilhante, a cargo, sobretudo, dos dois protagonistas e uma fotografia admirável, O Amante capta de forma absolutamente envolvente a essência do despertar sexual e do desejo proibido, como nenhum filme o fez até hoje.





Jane March é fascinante no papel de uma adolescente francesa oriunda de uma família empobrecida que, na década de 1920, conhece um importante e abastado diplomata chinês (Tony Leung) durante uma travessia do rio Mekong.





Fascinada pela riqueza e sofisticação dele emanadas, a jovem deixa-se levar pela vertigem do amor e os dois envolvem-se numa relação clandestina e tórrida.





Mas se os amantes conseguem ultrapassar as diferenças de idade, raça e classe, a sociedade colonial francesa da Indochina jamais permitirá que se ultrapassem as diferenças culturais.

Realizador. Jean-Jacques Annaud Intérpretes. Jane March. Tony Leung Ka Fai. Frédérique Meininger. Arnaud Giovaninetti. Melvil Poupaud. Lisa Faulkner. Xiem Mang. Philippe Le Dem. Ann Schaufuss

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2008-05-10

Comemoração dos 10 anos da “Onda Poética na Academia de Música de Espinho no dia 3 de Maio – Crónica de um concerto em Sintonia Maior








A Onda poética nasceu na extinta Livramar, na Rua 62 – Espinho, em Março de 1998, tendo passado, anos mais tarde, para as instalações da Gulbenkian na Rua 21 e, pouco depois, para o Bar Dominó do casino de Espinho, onde efectua as suas sessões de poesia nas segundas segundas-feiras de cada mês.

Chagámos atrasadas. Eu e a Irene. Perdemos-mos na geométrica cidade de Espinho, onde deambulámos uns bons trinta minutos, como se estivéssemos no antigo labirinto da antiga Creta.

E perdemos a abertura do espectáculo e a magia da Water Music de Jorge de Sena, na voz de Carlos Jorge com a música homónima de Haendel a servir-lhe de cenário. Perdemos, também, a Chuva Oblíqua de Fernando pessoa pela voz de Luís carvalho, sublinhada pelas notas de Mendelsonh. A “chuva” continuou com o Chove de José Gomes Ferreira, interpretada por Céu Reis, cujas palavras iam caindo através da Bruma de Cláudio Carneyro.

Enquanto isso, Irene e eu andávamos às voltas, à procura da Academia de Música que ninguém, na cidade, parecia saber ao certo onde ficava…

Chegámos, finalmente, à recepção onde levantámos os bilhetes que o Luís nos tinha reservado quando, através da porta, nos chegam aos ouvidos as sedutoras notas da Syrinx de Debussy, pela flauta de Joana Oliveira…

Entrámos. Envolvidas pelo sortilégio das notas do “meu” compositor favorito. Como quem entra numa densa e misteriosa floresta, à espera de encontrar druidas, dríades, náiades…como as crianças na história do flautista de Hammelin…

Debussy continua a servir de pano de fundo à expressiva voz de Anthero Monteiro com La Cathedrale Engloutie de Jorge de Sena que ilustra a música com o mesmo nome do compositor francês da belle époque.

As palavras de Levi Condinho, Camilo Pessanha, António Gedeão, David Mourão Ferreira executam o seu ballet ao som de Elgar, Schumann, Bach, Brindle, Leo Brower e António Lauro, animadas pelo virtuosismo de vozes como as de Gilberto, Luís, Céu, Diana e Carlos Jorge.

Mas ninguém iguala a mestria de Anthero Monteiro cujo O dia-a-dia de um músico – de autotria do próprio Satie, extraído da sua obra Mémoires d'un Amnésique, traduzido por Anthero Monteiro – nos mostra um delicioso jogo de ironias acerca da rotina de um perfeccionista como Eric Satie. A crítica, implícita, ao romantismo ascético, onde tudo é perfeito e perfeitamente cronometrado, tal como na vida monástica. Mas só o preciosismo de um Eric Satie conseguiria criar algo tão divinal como a Gimnopedie

Após mais uma prestação de Céu Reis num poema de Levi Condinho, regressámos novamente a Claude Debussy com o animado Golliwog’s cake-walk por Ricardo Soares.

Segue-se o Concerto de portas fechadas de Tomás de Castro a dar, mais uma vez, oportunidade a Carlos Jorge de exibir o seu talento para as artes cénicas. Rematado, depois, pelo violino de Inês Breda, acompanhada ao piano pela professora Graça Bastardo, numa lindíssima versão da Méditation de Thaïs de Massenet. Uma performance que conseguiu arrancar as lágrimas ao fundo da alma da minha amiga Irene.

A Praça da alegria nº 11 de Tomás de Castro e Sentado numa cadeira de Al Berto foram mais dois (bons) momentos de descontracção a anteceder a frescura e vitalidade dos acordes de guitarra de Tiago Rodrigues com o Tristango en vos de Máximo Pujol.

Já o delicioso Andante from piano concerto in ck467 de Mozart serve de cenário à voz de Céu Reis enquanto declama O Menino Mozart de Carlos Murciano, seguida por Anthero Monteiro que opta por encantar a plateia com a alegre candura de um Mozart no céu de Manuel Bandeira.

A versatilidade da expressão facial e modulação da voz é-nos dada, mais uma vez, por Carlos Jorge com a Onomatopeia de José Régio para, logo depois, Luís Carvalho dar corpo à sedução de mais um poema de Levi Condinho – Mulher e Música -, com a envolvência do adaggio da 6ª sinfonia de Beethoven. A sensibilidade é trazida ao palco por Gilberto Pereira com o poema Meu Cão de Affonso Romano de Sant’Ana. Mas verdadeiramente sublime é a interpretação de Diana Devezas, a introduzir um momento de dramatismo e uma aura de tragédia digna de ser representada no Epidauro, com o Canto da Prisioneira grávida de Sidónio Muralha, acompanhado ao piano pelo Professor Francisco Seabra com a Sonata ao Luar de Beethoven – um dos momentos mais belos da noite.
Segue-se uma Cena de um filme…talvez para Truffaut de Levi Condinho, com Anthero Monteiro.

O espectáculo termina com uma Ode à Alegria da 9ª sinfonia de Beethoven, com letra de Anthero Monteiro acompanhada pelo coro composto por todos os participantes.

Uma noite inesquecível.


Cláudia de Sousa Dias

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