2007-10-27

“A Bela Adormecida” de Tchaikovski: um espectáculo que deliciou o público de Famalicão no Grande Auditório da Casa das Artes



A Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão apresentou, este fim-de-semana, nos dias 5 e 6 de Outubro, o espectáculo de bailado, intitulado “A Bela Adormecida”, uma peça musical da autoria de Piotr I. Tchaikovski, trazida à cena pela escola Ginasiana de Vila Nova de Gaia.
O corps de ballet era composto, essencialmente, por alunos amadores – ainda a frequentar o conservatório – mas de entre o qual já se faz notar algumas interpretações de elevadíssimo nível, a denunciar um potencial de qualidade superior. Sobretudo Mirella, a Fada Cor-de-Rosa – na apresentação de Sábado – cuja leveza de pássaro lhe facilita o elevado nível de performance técnica, demonstrada nos saltos e piruetas. Já Kátia, a Fada Lilás, mostra uma excelente capacidade de interacção com o público, onde facilmente nos apercebemos, também, que a capacidade de expressão ultrapassa a técnica propriamente dita, a qual já se encontra no patamar de “Bom”. O porte e a altura da jovem bailarina reforçaram a beleza dos movimentos executados.

Destacou-se, ainda, e antes de tudo, o desempenho da bailarina que interpreta o papel da Princesa – Elena Martinova – que nos chega da Escola Russa de Leninegrado e que conta, já, com um vasto currículo nos círculos balléticos, tal como o irmão, que interpretou a figura do Príncipe.

Elena personificou a beleza grácil nos movimentos sincrónicos das mãos, no voltear da perna, na extrema segurança ao executar saltos e piruetas e na fluidez mostrada durante as ligações entre várias sequências de passos.

Já a exibição de Andrei Martinov revelou-se um pouco mais modesta, em virtude de se encontrar lesionado.

Durante uma curta entrevista, após o final do espectáculo, o coreógrafo e director artístico Marcelo de Souza afirmou que, ao idealizar o guarda-roupa para a peça, pretendeu que esta se situasse, de certa forma, “fora do tempo” ou atemporal. Onde as fadas surgem como aparições, indo ao encontro da concepção mais tradicional do figurino e da coreografia do ballet clássico, o mesmo acontecendo em relação ao par protagonista. Já o guarda-roupa das restantes personagens, permite ao espectador situar a história em qualquer época, seja ela medieval, renascentista, na belle époque ou contemporânea.

Marcelo enfatizou, ainda, a intenção de introduzir o contraste entre o elemento clássico e o moderno, ao confrontar a dicotomia dos arquétipos do Bem e do Mal, que são sublinhados por dois estilos opostos quer no que toca ao guarda-roupa, quer a dança propriamente dita. Isto é: ao artificialismo do ambiente da corte, espartilhado no protocolo regido pelo Mestre-de-Cerimónias, Marcelo opõe a entrada da ultra-rebelde Fada Má e do seu séquito.

Ela é, nitidamente e desde o primeiro momento, “ pessoa indesejada, cuja presença é fisicamente incómoda, segundo afirma Marcelo Souza.

É, sobretudo, sexualmente provocadora, exibindo uma sexualidade ambígua e um visual inspirado nas drag queen – cabelo rapado, botas com plataformas e um vestido vermelho e preto de onde emerge um corpo musculado, a sugerir uma bomba de sensualidade, prestes a explodir.

A Fada Má e os seus seguidores tentam, ainda, introduzir o erotismo na corte, ao aliciar os outros intervenientes.

A interpretação desta Fada Má, com algo de dominatrix, esteve a cargo de Isabel Ariel e foi, sem sombra de dúvida, a melhor interpretação de todo o espectáculo, nivelada apenas com a de Elena Martinova.

Isabel alia, ao perfeito domínio da técnica de dança, um excepcional talento como actriz. Um verdadeiro “animal de palco”. Ou a Callas da dança moderna.


Um belo espectáculo, onde a improvisação do corpo de baile infantil proporcionou um momento de especial deleite e descontracção na plateia.

Um belo projecto de desenvolvimento e formação de novos talentos.


A continuar.

Em nome da Arte.


Cláudia de Sousa Dias

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2007-10-20

Cineliterário - Debate e partilha de opiniões na Biblioteca Camilo Castelo Branco


No passado dia 26 de Setembro o filme de Patrick Maarsden "O Bandolim do Capitão Corelli", baseado no romance homónimo do escritor franco-britânico Louis de Bernières, foi objecto de uma mini-tertúlia que se prolongou para além do tempo de projecção do filme.


O tema do romande incide sobre os antecedentes que estiveram na origem da guerra dos balcãs, abarcando também o papel das mulheres numa sociedade rural duma ilha grega, no meio do mar Jónico, nos anos 40. Uma ilha que é também um ponto estratégico disputado por vários impérios ao longo da História da Europa.


O livro fala, também, das fidiculdades de integração que quem pretende ser diferente, da religiosidade, costumes e tradições gregos, da relação da população nativa com os invasores, do contraste entre a bonomia eo espirito leggero dos militares que integram a divisão Acqui e o formalismo e rigidez autoritária dos alemães.


O debate foi enriquecido com a presença e os comentários da escritora Manuela Monteiro e de José Manuel Silva, empresário e cinéfilo.


Foram sublinhados, pelos vários intervenientes, aspectos como o aligeirar da narrativa para o grande écran, a transformação de um romance de elevado conteúdo dramático, histórico e político, referente a inúmeros acontecimentos chave que tiveram lugar no século vinte e que desencadearam significativas alterações geo-políticas nas décadas subsequentes, como a Guerra Fria e a queda do muro de Berlim, num folhetim adocicado onde brilha a presença de Penélope Cruz – algo inspirada em Irene Papas – e onde Nicolas Cage esteve muito aquém do seu melhor ao construir um Capitão Corelli algo superficial, um tudo nada light, seguindo um estereótipo da personalidade italiana tal como é vista nos EUA.


Do debate, extrai-se, à laia de conclusão, haver uma acentuada assimetria entre livro e filme, destacando-se o primeiro pela positiva.


Do filme, ressalta a beleza da fotografia, a perfeição da execução da cena do terramoto onde se observa a terra a sofrer contracções, como o útero de uma mãe a dar à luz.


Um facto de cariz geológico que adquire um significado metafórico, que poderá ser extrapolado para o campo da geopolítica, pressupondo uma nova ordem mundial que sofre outro revés em Novembro de 1989 com a queda do Muro de Berlim. A partir daí, estarão lançadas as sementes que desencadearam a Guerra na ex-Jugoslávia, altura em que foi escrita a obra.


O próximo debate do Cineliterário será no dia 31 de Outubro com o filme "Chocolate", do mesmo realizador, a pertir do best-seller de Joanne Harris.



Cláudia de Sousa Dias

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