O Realizador João Botelho na casa das Artes concentra Cinema, Literatura, Beleza e Arte numa obra única
“O Filme do desassossego” de João Botelho esteve na passada quinta-feira, dia 14 de Outubro, no Grande Auditório da casa das Artes e contou com um público interessado e entusiasta. O filme é baseado na obra literária intitulada “O Livro do Desassossego” de Bernardo Soares , um semi-heterónimo de Fernando Pessoa.
A responsabilidade pela presença do realizador na Casa das Artes coube ao Cineclube de Joane, associação que,l todas as quintas-feiras, leva a cabo a missão de exibir na casa das Artes cinema da melhor qualidade.
João Botelho, durante a curta intervenção dirigida à plateia e efectuada antes de se iniciar a projecção do filme, começou por agradecer à direcção da Casa das Artes e ao Cine Clube o empenho em trazer o filme a esta sala de espectáculos, tecendo rasgados elogios à qualidade do espaço como reunindo as condições ideais para se projectar bom cinema.
O realizador citou Mornau ao afirmar que “cinema é arte” – mas não sem alguma tristeza ao salientar que hoje em dia “o cinema é mais um comércio do que uma arte”; e que “é uma aventura tirar um filme como este dos cinemas dos centros comerciais e passá-lo numa sala como esta”.
“O filme é adaptado de uma pequena parte de uma das obras literárias do maior vulto da Literatura Portuguesa”.
O realizador explica que Bernardo Soares não é, na verdade, um heterónimo de Fernando Pessoa, uma vez que aquele é uma personagem exactamente igual ao seu Autor, isto é, seria mais um pseudónimo do que um heterónimo.
Segundo João Botelho, « “O Livro do Desassossego” foi muito tardiamente conhecido.»
O realizador teve acesso ao Manuscrito Original, um conjunto de fragmentos dispersos que demoraram muito tempo a serem reunidos, encontrando-se estes na posse de uma neta de Fernando Pessoa a qual lho cedera para, assim, poder fazer o filme.
João Botelho faz notar que esta obra de Bernardo Soares «É um livro armadilhado. É uma espécie de puzzlle. E está traduzido, actualmente, em trinta e sete línguas. Este livro só se atinge quando lido em voz alta; ou em voz baixa, mas desde que se oiça. “O filme do desassossego” é um filme para quem gosta de ler e, também de pintura. É um filme de luz e de sombras. É um filme de liberdade. E a liberdade só deixa de o ser quando incomoda as outras pessoas. Eu escolhi tirar este filme dos centros comerciais porque, ali, as pessoas se incomodam umas às outras com comida, barulho, pipocas…Hoje em dia os filmes comerciais são fantásticos, mas são escritos para adolescentes. O cinema adulto quase que desapareceu. Porque hoje os adultos ficam, quase sempre em casa. Este, é um filme para se ver e ouvir. É um filme onde intervém um quarteto de cordas e que contou com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian.»
De salientar a interpretação de Cláudio Silva no papel de Bernardo Soares ao assumir a personalidade sombria, depressiva, com algo de misantropo ou inclusive de misógino, deste pseudónimo/heterónimo de Fernando Pessoa; a fabulosa intervenção de Catarina Vallenstein a declamar um texto com a entoação perfeita encarnando o papel de uma mulher fatal conjugada com os planos sucessivos a iniciar com uma vista panorâmica da sala e a terminar com o pormenor dos lábios da bela actriz que ocupavam a totalidade do écran; por último, a fabulosa alegoria da Luxúria que se exibe impudicamente diante da Miséria, personificada na figura de uma mulher nua coberta apenas com o casaco de peles e as jóias que desfila arrogantemente diante dos sem abrigo.
As qualidades visionárias do Autor bem como a sua acuidade perceptiva da realidade social é entendida como detentora de um sem número de nuances entre os extremos em que se colocam o Bem e o Mal foi poderosamente enfatizada pelo realizador na frase que solta um dos mendigos na fila da sopa dos pobres:
“Deus é bom, mas o Diabo…também não é mau…!”
E mais não digo.
Cláudia de Sousa Dias
4 Comments:
E isto resume de forma excelente a sublime sessão de cinema a que assistimos.
:-)
obrigada!
espero que os restante membros do cineclube achem o mesmo...
csd
Que excelente programação!
Bjsss,
Madalena
Obrigada M, em meu nome e em nome do Cineclube.
csd
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