2010-07-13

"Emprego, Cultura e Livros"


Trabalho numa vilazinha nos arredores da minha cidade, onde prolifera o desemprego. Sobretudo entre as mulheres. A maior parte delas não tem carta de condução e as habilitações são escassas. A esmagadora maioria tem o 6º ano, ou o 4º, quando acima dos quarenta anos, ou ainda o 9º, quando abaixo do limite dessa idade.




Muitas não conseguem dizer-me o nº do telemóvel de cor, ou mesmo o código postal. O desemprego cresce de dia para dia: todos os meses fecham empresas na sua maioria ligadas à indústria têxtil.




A grande maioria também não consegue ler e interpretar as notícias nos jornais diários. Uma delas queixou-se há dias que o filho de vinte e poucos anos não conseguira preencher a ficha de emprego, numa altura em que se dirigiu a uma empresa de trabalho temporário para tentar arranjar uma colocação.




A maioria dos desempregados não consegue ser reabsorvida, naquela localidade, no mercado de trabalho por falta de qualificações por ser pouco polivalente.




Quando há poucos meses atrás uma emigrante do leste no sul do país afirmava, em entrevista à comunicação social na SIC, que "os livros são tão importantes como o pão", no Norte, uma jovem brasileira, com apenas o 4º ano de escolaridade, ao entrar pela primeirã vez ao meu gabinete, afirmava que estava a trabalhar numa firma de limpeza industrial e, com uma espantosa desenvoltura, afirmava que queria inscrever-se "para poder estudar" porque lhe fazia muita falta. O contraste é flagrante.




No entanto, para muita gente independentemente da ideologia política que professa, e que critica a ausência de cortes anunciada na cultura pela Ministra Gabriela Canavilhas, a cultura e, sobretudo, a leitura, ainda é considerada um luxo.


Uma ideia que é repudiada por Gonçalo Martins, poeta e contista, via facebook nos seguintes termos:




Assistimos há 15 dias a mais um aumento do IVA. Não foi um aumento apenas da taxa de imposto normal (20% para 21), mas também da taxa intermédia (12% para 13) e da taxa reduzida (5% para 6). Os fiscalistas dizem que se está a "taxar o consumo".


Desta forma os livros, incluídos na taxa reduzida, passaram a ser taxados com 6% de IVA.


A questão central é: O IVA é um imposto que aumenta o preço dos livros em mais 6% do que aquele que os editores estabeleceram como correcto para a venda dos seus títulos. Este imposto é pago, na totalidade, pelos compradores de livros: os leitores, as bibliotecas, as escolas, os professores, os investigadores, os cientistas, os estudantes, todos aqueles que utilizam o livro para estudo e trabalho ou como forma de enriquecimento pessoal ou profissional.


Não há outro uso para os livros a não ser este: serem lidos. Não se pode comê-los, não se pode sair à rua com eles vestidos, só os podemos ler. O IVA, portanto, enquanto imposto sobre o consumo dos livros, é na prática um imposto sobre a leitura. A verdade nunca é o que se diz, mas o que se faz: o Estado não gosta que os portugueses beneficiem da leitura. O Estado não compreende que grande parte da questão da produtividade se resolve com a formação, com a cultura, com a informação, em conclusão, com a leitura. (E se alguém tem dúvidas sobre isto falem com um médico que lê e outro que não lê e vejam a diferença de humanidade. Falem com um carpinteiro que lê e outro que não lê e vejam a diferença de capacidade de adaptação e criatividade).


Mas o Estado considera que a leitura não tem para o próprio Estado o menor interesse. Por esse motivo “castiga” quem lê. Taxar o acesso à leitura é, na prática, dificultar e atrasar desenvolvimento do país. Vários países europeus já compreenderam isto há muito tempo, passando a utilizar a taxa zero sobre o consumo dos livros. Isto porque os seus Governos reconhecem quanto os seus países já beneficiam com o acto da leitura. E compreendem que a leitura contribui para o enriquecimento pessoal e social - e consequente aumento de produtividade - dos seus cidadãos. Mas vamos colocar os pés no chão e perceber que existem 2 lógicas: A Lógica; e a Lógica dos Governos medíocres, como têm sido os Governos de Portugal.
Gonçalo Martins in Facebook
Cláudia de Sousa Dias

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4 Comments:

Blogger M. said...

Claro! Ler, para além de, obviamente, me ter ensinado a escrever, fez-me companhia, mostrou-me novas realidades, deu-me poder de abstracção, e instruiu-me sobre como relacionar factos e ideias. Mas, enfim, que importa: no fim, o que contam são as estatísticas...

14/7/10 10:44 da manhã  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

Mas tentemos explicar isto à maior parte das pessoas, mesmo com um nível de instrução razoável ou mesmo licenciadas. Aqui há tempos um psicóloga recém-licenciada a~dizia-me algo arrogante, que não lia ficção, porque com isso não aprendia nada...pode-se imaginar o grau ou capacidade de abstracção de entendimento de metáforas, alegorias ou capacidade de interpretação de uma pessoa que fala nestes termos...


csd

14/7/10 11:38 da manhã  
Blogger M. said...

"o que conta...", queria dizer.

14/7/10 11:38 da manhã  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

:-)


csd

14/7/10 6:24 da tarde  

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