2010-05-14

Arte, mestria e sensibilidade na noite de 27 de Abril no Ciclo de Música e Poesia da Fundação Cupertino de Miranda





O alinhamento musical da penúltima sessão dos Ciclos de Música e Poesia de 2010 que decorrem entre Janeiro e Maio na Fundação Cupertino de Miranda, foi preenchido com as interpretações de Vasco Rocha, um pianista extremamente jovem (17 anos), cuja mestria em nada fica a dever à de um veterano.


É raro este intérprete não obter o primeiro prémio em qualquer concurso que participe. Além do piano, modalidade com a qual preencheu todo o repertório musical do evento, domina também o violino, tendo já figurado na Orquestra Filarmónica de Lisboa Junior como concertino e na Orquestra de Jovens, como residente na Casa da Música. Vasco Rocha deliciou a plateia com a sonata nº10 em mi maior de Scarlatti, com o maravilhoso glissando da Arpa Eolica de Claudio Carneyro, imitando o vento a deslizar pelas cordas de uma harpa, transportada para as teclas do piano. Destacou-se também com uma belíssima interpretação dos Jeux d’eau de Maurice Ravel e com uma excelente execução da peça de Liszt Estudo de execução transcendente. Um momento raro, pela técnica, vivacidade e convicção impressas na forma de passar a música da pauta para o piano. Aliás, Vasco Rocha não utilizou qualquer partitura durante a execução das peças, reproduzindo-as de memória. O desempenho mereceu um aplauso entusiástico do público, que exigia um encore. Teve-o. Liszt, mais uma vez.
A segunda parte do evento foi, como habitualmente, dedicada aos poetas. A programação a cargo de Isaque Ferreira introduziu poemas vários autores como Natália Correia, Luiza Neto Jorge, Nizar Kabanni, Anna Akhmatova. Os temas em destaque foram o amor e a liberdade, como não podia deixar de ser, dada a proximidade da data da Revolução dos Cravos e do 1º de Maio. Mas o destaque foi dado aos poetas Egito Gonçalves e Rosa Alice Branco – a convidada especial da noite, que nos ofereceu uma poesia de um lirismo dilacerante, sobretudo nos poemas retirados do livro O Mundo não acaba no frio dos teus ossos escrito após a morte de Egito Gonçalves que foi seu companheiro, de que destacamos Só os gatos; A sono solto ou O copo de Heraclito.
A voz doce de Rosa Alice Branco caminhou, andarilha, pelos ritmos de vários poetas dos quatro cantos do globo, desde a América Latina até à Rússia, passando pela Síria…e, claro, dando voz aos poetas portugueses, revestindo todas as palavras de uma forma superior de beleza que se concretiza tanto no deslizar de um vestido pela nudez de um ombro amante, como na confecção de uma omelete.
Só a arte e o génio conseguiriam ser responsáveis por tal façanha.


Cláudia de Sousa Dias
P.S. A próxima sessão dos Ciclos de Música e Poesia da Fundação Cupertino de Miranda é já na terça feira, dias 18 de Maio às 21 e 30.
Não faltem.

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