2009-11-06

"À espera, no Restaurante"


Espero a Marta e mais três amigos, sentada à mesa, na “Sara Barracoa”. Um nervoso miudinho arranca-me pequenos arrepios na espinha. Nada relacionado, com a serpente cósmica da cultura hindu – a Kundalini –, mas a proximidade da apresentação do filme “Carandirú” de Hector Bebenco e da discussão do livro dentro de poucas horas está a deixar-me inquieta. Não gosto de ler livros requisitados na biblioteca. Espero não ser despedida ao escrever isto. Mas é só por não poder sublinhá-los a lápis e fazer notas à margem, como é o meu hábito. Não gosto de fazer fichas de leitura e escrever num papel à parte. Mas desta vez teve de ser, uma vez que o livro estava esgotado em praticamente todas as livrarias.
Releio, então, os apontamentos dispersos e tento organizá-los. Releio e sublinho. Com marcador fluorescente. A escrita sai-me sob a forma de crónica, por influência das últimas leituras: a do Dráuzio, a do Miguel, do Magris (claudiano como eu) e do soberbo Vintila, o romeno que escreveu, no exílio, sobre o mais falado romano exilado em Tomos, na antiga Dácia: Ovídio, o poeta, maldito para o Imperador Augusto, autor do provocador “A Arte de Amar”.
As escritas dos diversos Autores colam-se-me ao espírito e passam para a esferográfica. Não consigo evitá-lo. Acabarei um batido, não digo cocktail, porque raramente bebo álcool, de gerações, séculos, milénios da forma de escrever dos que se podem chamar “verdadeiros escritores”. Sem um pingo de originalidade. E, como tal, tenho de me resignar a nunca ser “escritora”, na verdadeira acepção do termo. Não procuro o sublime para impressionar a humanidade, como ambiciona A. Pedro Ribeiro, o ternurento e patético Nero dos tempos modernos e das letras inconvenientes. Espelho-me no espírito racional e pragmático de Agripina, agarrada ao mundo terreno. Apesar de tudo, fascinan-me os que se deixam alienar, movimentando-se no éter do mundo dos sonhos. Um romance onde figurassem todos os escritores contemporâneos correria ao risco de se tornar um plágio de “A Rameira do Diabo” de C. Clément. Ou mais um volume de intragável literatura adocicada, com veneno moralista a escorrer pela caneta fora.


A fome começa a apertar. Ouço um fado na televisão, enquanto observo o guarda-louça de nogueira, com tampo de mármore rosa e me lembro do toucador da minha avó. Desaguam na memória lembranças de almoços de infância, comunhões e baptizados naquela mesma sala, no restaurante já centenário, com a mesa cheia da presença dos que já partiram e agora é o José Luís Peixoto quem está a soprar-me ao ouvido. A parte superior do mesmo guarda-louça tem os copos de que me lembro, de vinho branco, tinto, água, mas as taças de champanhe inspiradas nos seios de Maria Antonieta foram substituídas por elegantes e pudicas flutes. Que pena.

Bem...chegaram os convidados. Bom apetite a todos.

Black Desert Rose

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4 Comments:

Blogger Helena Teixeira said...

Olá Claudia!
Tudo bem?
O seu texto já saiu na Aldeia.Já comentei :)
Mal está acabando a Blogagem de Novembro,já a venho picar para se meter noutra ;)
A Blogagem de Novembro está quase a terminar.Foi calma e por enquanto todos estão mais ou menos ao mesmo nível.Muito fair-play,está bonita :) e os textos são recordações marcantes.
Aproveito para a convidar para participar na Blogagem de Dezembro.O tema é: O Natal na Minha Terra.Já sabe:texto máx. 25 linhas e 1 foto até dia 8/12 para aminhaldeia@sapo.pt
Desta vez,haverá uma novidade diferente.Verá ;)
Jocas gordas
Lena

24/11/09 11:20 da manhã  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

já vi, Lena!

agora mal posso esperar para ver comentários e vortações. eu encontrei três textos que se destacam um pouco dos restantes.

mas a minha votação vai direitinha e einequivocamente para um deles onde já deixei o comet.

mas ao voto ainda vai ter de esperar até ao dia 28

;-)

beijos


csd

24/11/09 11:34 da manhã  
Blogger Gustavo Carneiro said...

"Taças de champanhe inspiradas nos seios de Maria Antonieta"?! :-)

Mas que forma interessante de descrever uma taça de champanhe. E sem nunca ter visto os ditos seios, já fico com uma boa ideia da suposta forma deles... ;-)

25/11/09 6:48 da tarde  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

penso que, pela forma das taças, deveriam ser mais ou menos como os da soraia Chaves...

:-D


csd

25/11/09 9:28 da tarde  

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