2012-05-07

A BALADA DO SENA



Photo by Sandra to Resim & Fotoğraf.

Um rosto difuso passeia sob as pontes
espreita quilhas, o cinzento da madrugada,
vidas entrelaçadas, chuvosas raízes,
mil desejos que se perdem como luzes na água espessa.

São Luís reclinado na Sainte Chapelle.
Os anos passam a voar.
Uma senhora estrangeira penteia-se na parede
e uma rosa floresce no olho esquerdo do grácil unicórnio.

Voam os estandartes. Em Saint-Julien-le-Pauvre
dizem Missa perpétua pelos afogados nocturnos.
Sinto como sobe, agora, a maré.
Como sobe a maré.
E os lábios de Paris.

Algo de fosforecente passa sob a água.
E há um restaurante chinês na rua Grégoire de Tours.
Gertrud Stein morreu faz agora sete anos
com uma doce melancolia perfumada.
Au revoir, mes amours.

Quando o movimento devora este silêncio
uma voz declama, boulevard Saint-Germain,
os versos de uma balada misteriosa e obscura.
Mas sobe-me pelos pés a relva, o mato,
e também o sangue do meu país.

Debruço-me a olhar o Sena.
Os pássaros de Abril fugiram tristemente.
Penso na minha vida,
alguns dias alegres e distantes.
Outros olhos contemplarão o Sena, penso.
A terra, nos meus olhos, florirá alegremente.

Joan Perucho
in "Os Luggares da Poesia"

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